Mecânico
Pronto, amigo
Pronto, amigo
(Sim, eu tenho um mecânico que é meu amigo, apesar da contradição e de ele me tratar por você)
Eu
E o carro precisa de mais alguma coisa?
Mecânico
Agora só tem de voltar cá daqui a dez mil quilómetros.
Agora só tem de voltar cá daqui a dez mil quilómetros.
(E esta forma de eles medirem o tempo, em quilómetros, Diz-me as horas, por favor, Concerteza, são seis mil setecentos e trinta e quatro quilómetros e duzentos metros, ou Faltam três mil duzentos e sessenta e cinco quilómetros e oitocentos metros para os dez mil)
- O carro está óptimo, não se preocupe. Vê-se que está bem cuidado.
Eu
- Muito bem, daqui a dez mil quilómetros eu passo por cá.
Mecânico
Eu
- Imagino...
Mecânico
- É de um miúdo, anda para aí a varrer rotundas, só gosta de acção. Desmancha o carro todo e no fim o avôzinho passa cá e paga a despesa.
Eu
- Antes assim, ao menos vai ganhando uns cobres à conta do piloto.
Mecânico
- Mas não é isso que está em causa. É que parte o carro todo e vai-se chegar a um ponto em que não há reparação possível. (Ah, a consciência do pirata que não suporta ver os barcos das presas a afundar, quando poderiam dar mais uma ou duas voltas...)
Eu
- Muito bem, daqui a dez mil quilómetros eu passo por cá.
Mecânico
- É que nem calcula os assassinos que aqui vêm parar... olhe, aquele Golf, por exemplo, (aponta para um carro preto) está todo assassinado.
Eu
- Imagino...
Mecânico
- É de um miúdo, anda para aí a varrer rotundas, só gosta de acção. Desmancha o carro todo e no fim o avôzinho passa cá e paga a despesa.
Eu
- Antes assim, ao menos vai ganhando uns cobres à conta do piloto.
Mecânico
- Mas não é isso que está em causa. É que parte o carro todo e vai-se chegar a um ponto em que não há reparação possível. (Ah, a consciência do pirata que não suporta ver os barcos das presas a afundar, quando poderiam dar mais uma ou duas voltas...)
- Desta vez foi um eixo traseiro. A semana passada... (dirigindo-se para uma banca no canto da oficina) ...venha cá ver! (abre uma saca de plástico e espreito lá para dentro, onde jaz um ferro cilíndrico e comprido quebrado em dois) Que me diz?
Eu
Não pode ser!
Mecânico
Ai pode, pode!!!
Eu
Mas como é possível?
Mecânico
É tramado não é?
Eu
Como é que ele fez isto?
Mecânico
A varrer!
Eu
Mas isto não parte assim!
Mecânico
Pois não parte! Mas esta partiu.
Eu
Se não visse, não acreditava.
Mecânico
Nem eu. Mas é verdade.
Não pode ser!
Mecânico
Ai pode, pode!!!
Eu
Mas como é possível?
Mecânico
É tramado não é?
Eu
Como é que ele fez isto?
Mecânico
A varrer!
Eu
Mas isto não parte assim!
Mecânico
Pois não parte! Mas esta partiu.
Eu
Se não visse, não acreditava.
Mecânico
Nem eu. Mas é verdade.
Saí da oficina a pensar na tristeza de saber que mesmo vivendo mais duzentos anos, será impossível experimentar novamente o choque proporcionado pela visão de uma peça inquebrável afinal quebrada, da qual eu apenas sei que se situa dentro do automóvel, algures entre o pára-choques dianteiro e o pára-choques traseiro.
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