sexta-feira, dezembro 29, 2006

Que bem que faz ao corpo

Ah, depois da correria às prendas de Natal , não há nada como limpar o organismo com uma boa corrida aos saldos... perdão, às reduções, que os saldos só começam a 7 de Janeiro.

E é de mim ou calções não ligam com botas de cano alto?

BONNE ANNÉE POUR VOUS

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Já alguma vez pensou em mudança de carreira?

As figurinhas que obrigam o rapaz a fazer. Como se não bastasse a quantidade de cenas pouco edificantes que alguns meliantes brindam o quotidiano, lá vem mais esta, agora ao abrigo da quadra que agora se aproxima (em abono da verdade já se está a aproximar desde meados de Outubro).
Depois da piroseira da bandeira, agora vemos por todo lado o Pai Natal a assaltar as varandas e janelas. Mas desengane-se quem pensa que o Homem de Vermelho está apenas a tentar entrar em casa, porque não cabe no tubo do exaustor. É mais um sinal dos tempos. A carreira profissional não lhe tem corrido bem, até porque vem desenvolvendo pequenos trabalhos temporários.
Depois de algum tempo a limpar chaminés, onde acumulava um par-time como podologista, encarregue de analisar da existência de matéria fúngica em milhares de sapatinhos, passou pelos volantes dos camiões da Coca-Cola. Foi
entretanto dispensado da empresa após um escândalo, pois foi surpreendido a beber Pepsi (a fotografia até correu a Net). Agora está no ramo da impermeabilização de varandas e instalação de marquises.
O futuro não é nada risonho para o sorridente velhote; agora que a obesidade infantil é encarada como um dos males do século XXI, a invocação da sua figura por motivos pedagógicos sempre que os meninos não se comportem em termos não será muito consistente (“ao contrário não leva prenda do Pai Natal”). Ver-se-á obrigado a emagrecer com dietas que não permitem a fruição de bebidas gaseificadas caramelizadas.
Mais um caso a acabar-se onde começou ou a prova de que a vida dá estranhas voltas.

El C.

sexta-feira, outubro 13, 2006

Ensaio sobre a Cegueira (minha)

Hoje é um dia singular, treze, sexta-feira, e eu mergulhado num restaurante de todos os dias, onde se repara com qualidade e sossego as peles da sobrevivência. Com o sossego possível, diga-se, porque na mesa ao lado, dois alarves vão SONORAMENTE deglutindo um arroz de cabidela, ao mesmo tempo que conferenciam com um terceiro menos alarve, sentado duas mesas mais à frente.
Espalho os olhos sobre as páginas ásperas do diário que já foi gratuito e vou lançando as vistas pelas parangonas, ao mesmo tempo que vou tentando chamar a atenção de um dos cinco camareiros que fazem as mesas. Estranho lugar, este, onde os que me conhecem desde criança me tratam por doutor e os que me conhecem há dias me tratam por tu – vou pensando - Em antropologia cultural chamar-se-ia deferência inversamente proporcional à cronologia da agnição.
Saio mentalmente dali e relembro outros lugares, outros restaurantes, bem mais chiques, com buffet, e logo começo a divagar sobre tudo isto. Mais um termo francês, provavelmente originário do antroponímico de quem o inventou/ descobriu/ achou (importa é não ferir sensibilidades), como a nicotina (de Nicot), o cabaret, o sal Vatel e bidé (de Bidet), este último indivíduo dadivoso de incontáveis e prazenteiras rotações na tumba, pela excelência de um invento perante o qual as mulheres não resistem em abrir as pernas.
Estranhos lugares, estes, o da mente. Que desconfio ser paralítica, porque nunca na minha existência serei possuidor dos laivos de génio necessários à escrita de um comercial sobre telecomunicações, no qual os personagens aparecem trajados na parte de cima como yuppy’s dos anos 70 e de membros inferiores mascarados à tenista dos anos 80.
Vai buscar.

quarta-feira, setembro 20, 2006

Uma Advertência

Não confundir Caso Mateus com Casa de Mateus: apesar da semelhança do rótulo, a marmelada é muito diferente.

terça-feira, setembro 19, 2006

A Duplicidade de um Gesto

Ontem, ou melhor, hoje de madrugada, no final do debate sobre a Educação em Portugal (ou como eu gosto de lhe chamar, a LXXVIª Corrida RTP), não pude deixar de admirar aquele gesto da Sra. Ministra no seu balancete final, palma com palma, dedos esticados, polegares no queixo ... uma súplica ou uma prece? Um momento de profunda introspecção filosófica, como se estivesse a medir aquilo que a sua boca ia debitando, ou um pedido de desculpas pela balbúrdia que só não é maior porque existe um caso mateus não sei bem onde?
Os sindicatos é que já começaram a mexer. O debate acabou à 1h47 e às 2h03 já se podia ler o comunicado do Sindicato A (o dos professores que realmente vivem o fenómeno sindical): "a pose da Senhora Ministra da Educação é a marca do repúdio da Constituição Portuguesa, representando os valores conservadores e beatos de uma sociedade arreigada no mais cego catolicismo e ajoelhada no altar do desprezo à liberdade religiosa própria dos modernos Estados laicos".
Por seu turno, o sindicato B, o qual é integrado pelos professores que desejam crédito mais barato para comprar casa, já veio dizer que "não obstante o esforço que os professores fazem diariamente para garantir uma melhoria na qualidade do discurso das crianças e para a diversificação das formas de comunicação não verbal, a Senhora Ministra vem dar um péssimo exemplo e bloquear, dessa forma, a acção dos professsores do ensino especial que não tiveram hipótese de proceder à leitura dos lábios da responsável máxima da Educação do Governo Português".
Por curiosidade, nenhum dos sindicatos mencionou nas suas comunicações a palavra trabalhar.

quinta-feira, setembro 14, 2006

Uma questão de Patentes

Nesta semana em que arrancou o novo ano escolar, dei conta do real problema da educação em Portugal: a responsabilidade da educação das crianças, afinal o futuro da nossa nação, não pode andar nas mãos de meros encarregados. Arranjem-se managers de educação, consultores de educação , CEO's ou mesmo agentes de educação para os petizes. O encarregado de educação não passa de um capataz, de um feitor, de um caseiro. Ou promova-se o encarregado a pai!

sexta-feira, agosto 18, 2006

Ah, Agosto, Quelles Souvenirs ...

Não acredito que a francesada que assola a Nação durante os meses de Julho e Agosto frequente o território somente motivada pelo Turismo Sexual, tal como está propalado em alguma imprensa nacional. As francesas ainda vá, até porque qualquer macho lusitano que se preze tem no mínimo três ou quatro conquistas gaulesas no caixote do lixo (muitas delas anualmente reincidentes). Mas quem me convence que andam por aí gajos lusitanos a comer franceses, pá? Só de pensar naquele sotaque amaricado até fico com sezões. Serão os espanhóis quem os anda a comer? Será que conseguiram um subsídio da UE?
Até nisso estão à frente, mas por trás.

quinta-feira, agosto 17, 2006

Olho Bem Aberto

Perante as notícias dos distúrbios ocorridos ontem num voo destinado aos EUA, onde se detectou uma passageira com fósforos, uma bisnaga de vaselina e uma chave de fendas, não se pode censurar a atitude do piloto, que preferiu aterrar de emergência em Boston, em vez de seguir a New York; é que não sendo a vaselina inflamável, a visão de uma chave de fendas com vaselina nestes tempos conturbados para as tripulações dos aviões não foi decerto encarada como um bom presságio para a entrada na Cidade que Nunca Dorme.

quarta-feira, agosto 16, 2006

Expresso do Oriente

1. Constato com agradável surpresa que o Expresso desta semana contém mais um suplemento. É um poster 57cmx74cm da Floribela. Vai ficar a matar no meu gabinete. Melhor foi encontrar na pilha de papel para reciclar o poster-karaoke que havia sido editado na semana passada.
2. Sobre os terroristas aprisionados em Inglaterra, dizia o Expresso: "Através de escutas telefónicas e graças à infiltração de um agente do MI5 no grupo, as autoridades britânicas ficaram a saber que o plano destes jovens era lançar um ataque terrorista maior que o 11 de Setembro. Em Dezembro do ano passado, revela o diário "The Guardian", os serviços secretos e a polícia começaram a controlar os seus movimentos e contas bancárias: o que liam na internet, onde gastavam o dinheiro, que lavandarias utilizavam."
Não quero menosprezar a vigilância efectuada pelos serviços secretos britânicos - até porque sei o que custa esperar que a vizinha do bloco em frente vá dormir e quanto pesam os binóculos - mas onde é que montar atalaia a lavandarias traz sabedoria ao processo? É certo que a religião muçulmana se baseia na higiene, mas isto é de mais.
A não ser que o fundamentalismo advenha da exposição continuada à rotação da roupa nos tambores dos secadores, porque se assim é, Senhores da Secreta, eu tenho dois vizinhos solteiros que estão sempre a conspirar moedas de 0,50€ na lavandaria ao pé de minha casa.
Croius

quarta-feira, julho 26, 2006

Para umas Férias sem Stress

Porque as férias estão aí à porta, mais curtas é certo, mas urge o sacrifício (observe-se o exemplo de estoicismo dado pelos magistrados que viram as "férias judiciais" tão brutalmente mutiladas), vale a pena partilhar com os meus amigos alguns conselhos para que o stress tão castrador do ócio não vos estrague a seally season.

1. Desconfiar da expressão "abertura fácil" em todas as embalagens;

2. Evitar entrar em lugares que tenham as palavras reduções, há selo para veículos e simplex;

3. Lembrar que perante o termo puxe/ empurre existente em algumas portas, deverá executar o movimento contrário daquele que está a pensar executar (as pessoas quando lêem empurre tem a tendência a puxar e vice-versa);

4. Evitar o convívio com pessoas que abusam do emprego de expressões latinas no discurso coloquial, como a priori, etcaetera, sic transit gloria mundi, a posteriori e habeas corpus.

Boas férias

segunda-feira, julho 10, 2006

O Melhor Remate do Mundial

Que melhor maneira de se rematar o Mundial de 2006 que ter o hino de Portugal cantado pelo portuga-brasileiro? E aquele sotaque n' A Portuguesa, meus amigos? Para o ano está batidinha no Carnaval do Funchal!

sexta-feira, julho 07, 2006

O Engenheiro Médico

Já aqui abordei, ainda que só pela rama, a figura do engenheiro-médico (o Crítico, de15 de Novembro de 2005). O engenheiro-médico é um sabe-tudo, aquele indivíduo que se sente à vontade para abordar criticamente todos os assuntos arremessados para o tampo das mesas de café, quer sejam as grandes opções de desenvolvimento da nação, quer sejam as obscuras teias do poder político, saúde, cinema, viagens e lazer, discotecas e putas, carros, motas e bicicletas, pesca e caça, gastronomia e vinhos, literatura e, claro, acidentes de viação. É aqui que o engenheiro médico se transcende: perante o sinistro, o engenheiro-médico assume esplendorosamente a sua função e desata a tecer considerações fisico-estruturais do traçado da via, condições do pavimento e demais circunstâncias relacionadas com as causas do embate, sua natureza e posterior reconstrução minuciosa a partir dos elementos visíveis no local a olho nu (mais tarde, perante público fiel do café, montará um verdadeiro croquis tridimensional com o tabaco, o telemóvel e a caixa de guardanapos, para melhor ilustrar as suas prestimosas deduções, todos lamentando o facto de os peritos de seguradoras não poderem dispor deste manancial de provas científicas), ao mesmo tempo que avalia o estado da(s) vítima(s), se as há, estabelecendo um célere e mui completo diagnóstico abarcando análise de alcoolémia, exame oftalmológico por mor da cegueira nocturna, TAC’s à cabeça, radiografias ao esqueleto e ecografias aos tecidos moles, tudo num passar de vistas sobre os ditos acidentados. Chegada a ambulância, o contuso já tem a triagem feita e pode ser encaminhado às diferentes especialidades hospitalares.
Na personalidade de cada português existe uma parte de engenheiro-médico, de proporção variável, porque não existem dois portugueses iguais (assim que se explica que quando há um acidente toda a gente abranda para fazer a peritagem). A variação prende-se pela maior propensão do indivíduo para o conhecimento de uma das ciências, a Medicina ou a Engenharia, articulando com o menor conhecimento da outra e vice-versa. Um português médio tem cerca de 21,7% de engenharia-médica, do qual dois terços são engenharia e um terço é medicina (por isso são os portugueses tão fortes a matemática e português e ainda consigam fazer uma perninha na farmacêutica). Existem também os portugueses acima da média, que têm mais engenharia-médica, às vezes 50%, mas existe um que é considerado um verdadeiro milagre psicológico, porque consegue articular em 100% das duas vertentes, tornando-se o único engenheiro-médico a 200%, para além de ser Professor a 120% e Doutor a 165%: é o único caso de Professor Doutor Engenheiro Médico.
Este indivíduo, a grande revelação portuguesa durante o Mundial de 2006, simultaneamente maior vitória e grande conquista, sossega a nação a cada dia que passa, não somente pelas competências que diariamente vai adquirindo, mas pela destreza com que o faz. Desta vez foi vê-lo a comentar o futebol e a prestação da selecção nacional apresentando-se como o trunfo viável da RTP perante ao progressivo perder da chama gloriosa de Gabriel Alves face aos especialistas da SportTv, que inaugurou uma nova página no jogo pensado com as antevisões científicas de António Simões sobre os adversários de Portugal, plena de linguagem técnica que só conhecemos aos olheiros do Benfica e a eterna mãozinha esquerda judiciosamente escondida no bolso, qual fadista da bola.
A próxima temporada futebolística será agora avaliada com aquele olho de lince cruzado com águia, antevendo-se um campeonato mais limpo, mais transparente e melhor jogado. O Professor Marcelo é a grande vitória portuguesa. Mais do que o título mundial, a valorização do páis através da “excelente imagem das qualidades junto da comunidade internacional” (as cabeçadas, saltos para a piscina e o recorde de cartões num jogo): Portugal conquistou um homem melhor.
C.

terça-feira, junho 27, 2006

Misteriosos os Desígnios do Senhor

Se houve coisa que me fez pensar nos estranhos desígnios do Senhor foi o que ocorreu na noite de Domingo, mais propriamente naquilo que agora se chama a Batalha de Nuremberga. Como alguém disse num fórum radiofónico, “o comportamento dos jogadores portugueses foi heróico, foi estóico, olhe faltam-me os adjectivos” (poderia ter empregue outros adjectivos acabados em -óico, como minóico, paleozóico e perestróiko). Este tipo de comportamentos em terras de Camões, outrora frequentes e de tal monta que os víamos em todo o lado, são agora raros, em clara perda, excepto na Assembleia da República, local onde ainda se observam aquelas grandes qualidades do Império Ultramarino (o hino nacional por alguma coisa alude aos egrégios...).
Esta renovada força que literalmente cabeceou os tamancas-laranjas para fora da competição cilindrará também os tommys, à semelhança do sucedido no Euro 2004. O Portugal-Brasil das meias-finais a 5 de Julho ficará conhecido como a Batalha de Munique, assim chamada pelo embate titânico das arcadas dentárias superiores de Petit e Ronaldinho Gaúcho, provocando um número não estimado de feridos e contusões derivadas das faíscas emandas da fricção. A eliminação do Brasil do mundial vai provocar ondas de choque e uma crise diplomática sem precedentes entre os dois países, culminando no embargo à exportação de novelas da Globo e à expulsão dos pastores da Universal Reino de Deusdo canal 11 da TV Cabo.
No final, por intervenção do grande mediador de conflitos do mundo Atlântico, o grande democrata Hugo Chavéz, a crise chegará ao fim quando sua alteza Ronaldo I, El Gordo, monarca da ilhota de Angra, passará para outro ronaldo insular, Cristiano Ronaldo, El Romero, o título de el-principal-pina-modelos-capa-de-hola-y-mujer-hodierna.
Misteriosos são os desígnios do Senhor...

segunda-feira, junho 19, 2006

Notas sobre Modelismo e (alguma) Literatura

Estou a terminar a leitura do romance de espionagem chamado The Bourne Ultimatum, de Robert Ludlum, obra cuja primeira parte já foi transposta (a meu ver muito mal) à tela, i. é, a Identidade de Bourne e a Supremacia de Bourne. A páginas tantas, depois de uma série de peripécias, introduz-nos o autor no vale do Volkhov, na então soviética Novgorod (p. 505-550), local de impossibilitado acesso, por se tratar de um complexo secreto de treino de agentes infiltrados. Novgorod era, na imaginação de Ludlum, o local onde se reproduzira à escala uma série de cidades e portos do mundo inteiro, qual Portugal dos Pequeninos, onde se obtinha informação ou se procedia à construção de armamento ou tecnologia de ponta. Através da fotografia de satélite reproduziam-se os mais ínfimos pormenores, permitindo aos agentes soviéticos o treino no quotidiano civil de tais localidades ou centros de inteligência para que se sentissem familiarizados nos sítios onde, como se requer aos espiões, recolheriam informação. Entre alguns dos locais recriados, destaco as oficinas aeronáuticas de Coventry, os estaleiros de submarinos nucleares de New London no Connecticut, o Cabo Canaveral na Flórida, o Paseo del Prado em Madrid e as margens do Tejo em Lisboa.
Leram bem. Nesta mítica Novgorod, local onde, segundo o romance, teria sido treinado o ultraperigoso e venezuelano assassino Carlos, o Chacal, existia uma réplica à escala de Lisboa. Como a acção decorre um pouco antes da queda do Muro, certamente que a paisagem lisboeta lá recriada não seria muito diferente da que lhe conhecemos hoje sendo mais que certo que em Novgorod existiria um Terreiro do Paço, um Marquês, um Rossio e até um Parque Eduardo VII. Para se obter uma versão aproximada, pode-se aceder ao google earth e viajar pela fotografia aérea de Lisboa, navegar no estuário do Tejo e no Mar da Palha, observar a geometria pombalina da Baixa, etc. A diferença é que não se assiste agora como então à procissão de meninos para o apartamento da Avenida das Rua Forças Armadas, nem se avista uma nuvem negra carregada positiva e electricamente que em 1989 ensombrava permanente os palácios de Belém e S. Bento.
A questão que me martela o cérebro é esta: se os requisitos para a recriação em Novgorod do modelo de uma cidade residia na sua importância como centro de inteligência ou associada a centros de produção de armamento ou desenvolvimento tecnológico, e não conhecendo lá nenhuma fábrica de mísseis nem electrodomésticos com selo made in Portugal, porquê o interesse dos soviéticos em Lisboa?
Julgo que é um daqueles mistérios literários propositadamente acalentados para induzir o leitor a adquirir a sequela. O que é uma manifesta perda de tempo, já que o livro não presta.

segunda-feira, maio 29, 2006

Carta ao Director

Ex.mo Sr. Dr. Croius:
o zelador do espaço de reflexão cultural, quotidiano e tempestade cerebral que V. Ex.cia governa vem por este meio reportar que ontem, dia 28 de Maio, completou trezentos e sessenta e cinco dias (um ano) ao serviço de V. Ex.cia. Permita-me dizer da extraordinária coincidência da efeméride, já que no mesmo dia se completavam oitenta anos do glorioso golpe militar preconizado pelo General Gomes da Costa que introduziu em Portugal o mais áureo período na nossa existência.
Certo que V. Ex.cia estará interessado em saber da gestão do sítio durante o ano transacto e empenhado no desenvolvimento da qualidade dos serviços prestados à população que diariamente nos visita, tomo a liberdade de lhe deixar aqui alguns apontamentos.
Em primeiro lugar o espaço conhecido como Salmoura teve 1219 visitas, o que não é muito, atendendo-se ao facto de 1183 delas serem da responsabilidade do zelador para proceder à limpeza e asseio do local. Rogo a V. Ex.cia que seja providenciada a colocação de uma placa a pedir às pessoas para não deitarem puriscas de cigarro para o chão. É que isto está com tanta cinza como os montes portugueses; seguimos, assim, a boa experiência de se ter pregado a placa contra as latas de cerveja, porque nunca mais houve latas no chão nem problemas com as formigas.
As pessoas têm-se queixado que vêm aqui muitas vezes e não há muito que ver. Eu digo-lhes sempre que o Sr. Dr. é uma pessoa muito ocupada e que isto não é nenhum jardim zoológico, apesar de parecer, tal a cambada de animais que frequenta o espaço. E depois é preciso notar que nas cinquenta e duas semanas que passaram, o Sr. Dr. publicou quarenta postas, o que dá uma média de 0,77 postas por semana. Por isso não é assim tão mau, porque em lugar nenhum está escrito que isto é um diário.
Ao nível dos visitantes, se calhar era preciso começar a reservar o direito de admissão, como aqueles espaços de diversão noturna costumam fazer, porque tem aparecido muito indivíduo mal parecido que vem dar mau nome à casa. É o caso de alguns vermelhos (eu consigo farejá-los à distância, por causa do cheiro a vodka e a criancinhas do pequeno-almoço) e o dono do quiosque aqui em frente que agora deu-lhe para aparecer por aí de gabardina a melindrar quem por aí passa. Um dos visitantes insiste em dizer que se devia alcatroar os arruamentos e betonar os passeios. Se calhar não era má ideia.
Resta dizer que está tudo conforme; comprei duas vassouras novas, um cadeado de luquête e tintas, porque é preciso pintar as grades do muro.
Tomei a liberdade de mandar celebrar uma missa em honra deste aniversário na Sé.
Sem mais, subscreve com atenção,
Isidoro, zelador de blog.
P.S. Espero que não fique ofendido por referir isto, mas considero haver justeza se me fosse atribuído um pequeno aumento acima da taxa dada pelo governo à Função Pública, acrescido de serviço de turno, em valor igual ao que o Sr. Dr. Rui Rio brindou os lixeiros na Câmara do Porto.

segunda-feira, maio 22, 2006

Quando a discordância força a concórdia

Ontem fui ver o Da Vinci Code; como já uma vez escrevi sobre a patranhada escrita (Carta Aberta ao Sr. Dan Brown), vou agora falar da patranhada filmada.
Para quem não leu o livro, o filme deve ser difícil de seguir: factos bombardeados sem contextualização, tudo de chofre. E as imagens retro que constantemente assolam a mente das personagens só complicam. Para os que leram o livro (é melhor chamar-lhe argumento) ficou apenas a constatação de pontuais alterações em relação à história. Suavizou-se a polémica inicial, aligeirando-se a tese nuclear da história. Com tamanho rol de actores (Hanks, McKellen, Reno, Molina e Bettany) O filme precisava de mais rasgo e força. Não obstante, vou aqui deixar nota de duas ou três prestações positivas repescadas na película.
1. Louváveis prestações da menina Audrey Tautou e do monge Paul Bettany; interessantes as cenas sobrepostas à acção que ilustravam as sinopses históricas.
2. Vê-se, finalmente, uma personagem a cortar a barba durante um filme! Começava a pensar que os argumentistas só compunham personagens imberbes. Na série Perdidos, por exemplo, ao fim de quarenta ou cinquenta dias na ilha, como é possível que os náufragos não estejam já com aspecto de figurantes do Planeta dos Macacos? Não se vê ninguém a cortar a barba nem a depilar pernas ou sovacos; no entanto transmitem um ar de quem acabou de se salvar dos destroços do avião. E afinal o escanhoar é importante para a acção porque é aí que o artista descobre o que eles andam à procura. Digno.
3. Por incrível que vos possa parecer, vejo-me obrigado a concordar com uma posição do Senhor Nuno Rogeiro. Na sexta-feira escreveu ele no JN que se é lícito chamar a Dan Brown um hábil narrador, é no entanto falaz (o termo é meu) considerá-lo historiador ou mesmo arqueólogo. E achei muita piada ao que li hoje no Público, já que Umberto Eco se recusou encontrar-se com D. Brown em Vinci, terra natal de Leonardo, acusando o americano de ser “um intriguista que propaga informações falsas e material de embuste (...) Irei a Vinci quando lá estiver um verdadeiro escritor”.

No final do filme, questionada a minha querida esposa acerca do grado da fita, lembrei-me da fábula das duas cabras que, tendo invadindo um velho cinema, se encontravam a comer bobinas de filmes na sala do projeccionista.
– Que tal o filme? - pergunta uma.
- Gostei mais do livro!

quarta-feira, maio 17, 2006

Um Jardim com a Babilónia em Suspenso

Qual a solução para os problemas do Irão e aliás, de todo o Médio Oriente? Tão simples que ainda não entendi como é que les americaines ainda não o perceberam? Em primeiro lugar é necessário perceber-se que a psicologia do médio-oriental; trata-se de um indivíduo propenso ao estado de aborrecimento e ao crónico mal-encaramento. O tratamento passa por anular-se a fonte da mal disposição, facto que culminará na resolução de todas as questão derivadas daquele paradigma cultural. Depois de aturada reflexão, concluí duas causas para o estado pré-diarreico daquelas populações, respectivamente a barba e a areia.
Quando um homem deixa crescer a barba, passados cinco a seis dias começa a sentir umas comichões da sequente abertura do poro por engrossamento da pilosidade. Se o Sr. Presidente do Irão, Sr. Dr. Mahmud Ahmadinejad, cortasse a barba rente ou a rapasse, se calhar não teria as comichões que o levam, com o stress que daí advém, a desferir frases que qualquer dia serão confundidas com aleivosias de um maluco com uma desproporcional quantidade de petróleo na garagem (fenómeno conhecido na psicologia como complexo do dono da bola).
Depois é a questão arenosa. Quem já ouviu a expressão areia no sapato? Este termo traduz o pequeno incómodo sentido e que não deixa o indivíduo pensar em outra coisa com a clareza necessária. E meus senhores o que é que não falta no Médio Oriente? AREIA!
Logicamente, pretende evitar a entrada de areia no calçado quem almeja disfrutar de uma existência sem as arrelias petro-sapatianas, pelo uso de sapatos, sapatilhas ou botas herméticas. E o que é que os médio-orientais calçam? SANDÁLIAS!
É claro que assim não dá. Com o stress provocado pelas agruras de uma barba a crescer e com grãos de areia nas sandálias, até eu, meus amigos, quereria enriquecer urânio e limpar Israel dos mapas.
A solução passará por bombardear o Irão e arredores com lâminas e espuma de barbear e promover o ajardinamento dos desertos desde o Cairo até à fronteira chinesa, Índia inclusive. Plantando-se pinhais e relva, impede-se a acção nefasta das timosas areias e refresca-se a paisagem. Afinal, uma reposição mais ousada dos famosos Jardins da Babilónia, com o mundo em suspenso.
Croius

sexta-feira, abril 28, 2006

contra a agressividade

Lembrei-me recentemente de um episódio do startrek (série jean-luc picard) onde aparecia um alienígena omnipresente que, judiciosamente, se entretinha a observar as diferentes raças espaciais à luz de um código de conduta. Defendia aquela entidade (obviamente antropomorfa, como se querem os extraterrestres inteligentes) que a sociedade humana só sabia estar com violência.
Desde os primórdios da existência que a raça humana se entretinha a destruir-se mutuamente e isso foi convenientemente arquivado pela entidade como uma questão profundamente negativa. No seu entender, a solução para os problemas de agressividade permanente era só uma e, como juiz, juri e carrasco que se preze, comunicou à tripulação da ss entrerprise que seriam apagados da existência. A tripulação empeçou então a defender-se com exemplos de inteligência, os bons sentimentos e acções, etc. etc. etc..
A certa altura, o extraterrestre apresentou-se com os trajes militares do século XVII, século XIX, século XX (WWII) e como as grandes guerras haviam cessado, passou-se ao clima de guerra civil, em que os polícias eram os soldados. Como a volência era tal, naquele passado (nosso futuro?) a força era viciada em cocaína e só assim poderia ter motivação/dependência para combater o crime.
Não se espante o leitor com a ideia de os polícias se poderem viciar com algo, porque eles já o são. E é com o trabalho. E isto não é nenhum exercício de controlo de agressividade.
No dia em que me lembrei deste episódio, assisti pela primeira vez ao jingle que a sic está a passar sobre o mundial 2006, da sua exclusiva reposição. O videoclip apresenta uma série de portugueses a cantar e a dançar ao som karaoke da música mais foleira alguma vez composta para mundiais (logo a seguir do allez allez do ricky martin). É possível admirar o sorriso franco da senhora cozinheira, da senhora enfermeira, do senhor bombeiro, do senhor anónimo que passa na rua e do senhor polícia. Ora enquanto toda a gente canta e meneia a cabeça, o senhor polícia canta, meneia a cabeça e risca num caderninho enquanto olha para o lado.
Ainda dizem que existe muita agressividade. Enquanto apoia a equipa de todos nós, a polícia ainda tem tempo para aviar uma multa. Nunca será precisa cocaína para estes bravos.
Croius

segunda-feira, abril 03, 2006

Clap Your Hands Say Yeah

Um dos sinais da ruptura da moralidade dos tempos actuais está bem patente na promiscuidade com que se encara a sexualidade. Tomemos este exemplo. No outro dia desloquei-me a uma discoteca da nossa praça, só porque os bares fecham às duas. Pedi no bar o habitual, vodka-porto, nunca gostei muito de italianos. Vinte e dois segundos depois já duas adolescentes pintadas como o Grito do Munch estavam encostadas a mim, bêbadas como pipas. Disse-me uma com voz arrastada: Dás-nos boleia para casa, antes que algum indivíduo de má índole nos trate mal?
Acedi. Sempre tive jeito para escoltar vacas à sala de abate. Viviam na periferia e lá as deixei, depois de me terem vomitado catorze vezes no carro. Insistiram muito para que entrasse para mais um copo e mais não sei o quê, mas já tinha bebido o suficiente e já me falta a paciência para jogos às quatro da madrugada.
Só depois de ter passado toda a manhã de domingo a lavar os estofos do carro é que me dei conta do perigo que as raparigas corriam. Imaginem que outra pessoa lhes dava boleia, alguém sem escrúpulos que se aproveitava da sua inocência ébria e as maltratava, digamos, sexualmente. É que uma vez na casa delas eu poderia fazer TUDO o que eu quisesse, e não seria certamente jogar monopólio se eu fosse um predador sexual.
Foi aí que me lembrei da campanha desenvolvida em Inglaterra para dissuadir os meninos de abusarem de meninas que não conseguem dizer que não a uma queca ao sábado à noite por estarem positivamente alcoolizadas. A campanha tem um slogan parecido com se não te disserem um SIM, poderás ter de dormir com este na próxima vez e aparece a fotografia de um senhor com ar amistoso deitado num beliche de uma cela de prisão, ou por outras palavras, copular com a menina sem ela tiver manifestado o acordo prévio partilhas o chilindró com um biltre.
Tudo muito certo, mas como é que um indivíduo consegue provar que a menina deu o aval ao acto? Porque quando uma mulher diz sim significa não e vice versa. A forma segura de não ter problemas póstumos coitais poderá passar por uma declaração escrita, de preferência reconhecida por um notário. E como é que se arranja um notário às cinco da manhã?
Os Estados modernos (entre os quais se conta a nossa portentosa nação) possuem notariado privado. Com esta campanha será possível observar na rica fauna nocturna que fronteia as discotecas a barraca do notário, bem ao lado da barraca dos cachorros. Neste sistema perfeito, basta aos jovens de moralidade promíscua andarem atentos e esperar que alguma menina bata palmas e diga sim.

sexta-feira, março 24, 2006

Humphrey Saiu do Frio

No domingo recebi a notícia pelo The Sun: "Política Britânica de Luto. Morreu uma lenda ". O Público atacou com a parangona da última página de segunda-feira, "Morreu Humphrey". Fiquei triste, porque o conheci.
Humphrey era um ilustre funcionário do nº 10 de Downing Street, tendo entrado ao serviço ainda durante o consulado da Dama-de-Ferro Maggie Thatcher, em 1988. Este Humphrey era um respeitável indivíduo que por diversas vezes viu o seu nome arrastado para os jornais e até ao parlamento britânico. Numa vez quase foi atropelado pela limousine de Clinton e por pouco não despoletou uma crise diplomática entre bifes e yanques, só porque o rapaz passeava distraído pelas traseiras da casa.
Mais recentemente foi motivo de sururu no parlamento britânico,quando os Blair o exoneraram do seu cargo de vigilante da casa, porque aparentemente dormitava demasiado em serviço. Aí, o conservador Alan Parker receava que o moço tivesse sido abatido pelo SAS ou pelo MI6, exigindo provas da sua existência. Humphrey fez-se então fotografar em frente a um jornal diário fazendo prova de vida, qual refém de guerrilheiros columbianos.
Morre Humphrey e com ele morre a verdade sobre o sangrento assassinato da família de piscos que habitava as sebes do nº 10 da rua-que-desce, crime que lhe havia sido imputado mas logo desfeiteado pela cunha de John Major, que se encarregou de mandar arquivar o caso na penumbra dos arquivos da Torre de Londres.
Humphrey, um gato vadio que sabia muito, tal como os personagens de John Le Carré.

quarta-feira, março 08, 2006

Dois apontamentos por ordem de significância

I. Ontem morreu Ali Farka Touré. Quem não sabe quem ele era e o representa não passa de um infeliz ignaro.

II. Hoje, dia internacional da mulher, não me ocorre festejar a efeméride mais imbecil de todas, a que lembra à mulher que ela só o é no dia 8 de Março de cada ano. Por isso as minhas homenagens às mulheres que não ligam patavina a esta merda e até se sentem ultrajadas com estes festejos.

p.s. Aborrece-me constatar que o meu alter-ego é semelhente ao meu eu. E que 829 pessoas já meteram aqui as vistas. E ainda nem sequer passou um ano.

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Carta Aberta a Margarida Rebelo Pinto

Cara Senhora,
No jornal METRO de 22.02.2006 apareceu uma pequena coluna de opinião de Vossa Excelência. No seu profundo e inconfundível estilo literário que faz gala nos escaparates dos hipermercados desta gloriosa nação, escreveu a linhas tantas: «Júlio Isidro faz parte do património nacional do audiovisual». Mais à frente continuou, «graças à sua fisionomia peculiar e o seu estilo um pouco pomposo, tornou-se no estereótipo do apresentador à antiga portuguesa (...) Até eu, há quase 20 anos no Jornal “O Sete” tive a veleidade de lhe chamar Pateta Alegre numa coluna de crítica televisiva onde me divertia a arrasar as figuras mediáticas da época. Anos mais tarde, quando o conheci pessoalmente, descobri uma pessoa tranquila e simpática (...) Nunca, em algum momento em que me entrevistou em directos ou falou comigo particularmente, me referiu a crónica impensada e juvenil em que o criticava». Da glosa deste escrito podemos concluir o seguinte:

1º Vossa Excelência, imbuída de uma obscura autoridade, deverá julgar que foi a única a visionar a fastidiosa programação televisiva portuguesa dos últimos vinte e cinco anos, ao manifestar o portentoso silogismo «Júlio Isidro faz parte do património nacional do audiovisual»; se não o tivesse afirmado, ninguém o havia notado. Parabéns!

2º Se a ideia era engrandecer-se por referir a sua colaboração no jornal O Sete, o tiro saiu-lhe pela culatra. O Sete era um tablóide semanal estilo pasquim que nem para embrulhar peixe servia pelo excesso de tamanho da folha e apresentava tal prosápia transformada em linhas e palavras que poluíam de negro o branco sujo das páginas cruas, que daquela guisa inquinadas, nem para limpar o cú serviam, porque não se limpa merda com merda.

3º A Senhora afirma que se divertia a arrasar as figuras mediáticas da época. Em 1986, que me lembre, não havia assim tantas figuras como isso, eram para aí seis ou sete, e arrasá-las deveria ser uma espécie de obra inversamente proporcional ao trabalho titânico. Assim, podemos afiançar que os sinónimos hercúleo, plural, diversificado, vasto, intrincado e crítico não servem à caracterização das crónicas por Vós redigidas. Para desancar o Júlio Isidro, bastava muito simplesmente assistir ao Passeio dos Alegres (um excelente programa de entretenimento diga-se sem ironias) e anotar as tiradas do Carlos Miguel, o Fininho, que aludia religiosamente e passo a citar, às orelhas grandes, ao nariz de papagaio, às perninhas de alicate, etc., etc., etc. Mas assim não seria criticar, mas sim insultar.

4º A alarvidade juvenil em almejar o sucesso e o reconhecimento é aqui tão patente que a Senhora acaba por confundir o cavalheirismo e personalidade do Sr. Júlio Isidro com puro e simples desprezo que ele lhe votou pela “crónica impensada e juvenil em que o criticava”, porque lá diz o povo coração que não vê, coração que não sente e não se pode valorizar positiva ou negativamente algo que não conhecemos, como foi o caso.

Senhora Margarida
No rodapé da crónica aparece o seguinte: Margarida Rebele Pinto é escritora. Eu não gosto de literatura de adolescente à la Richard Bach, mas gostos não se discutem; defendo, contudo, que as suas opiniões, mesmo que sejam exames da consciência, não deveriam andar por aí impressas e a desvalorizar jornais gratuitos.
Atentamente,
Croius

sexta-feira, fevereiro 17, 2006

As Joaninhas e os Gatinhos

Querem saber que emprego é melhor que o de crítico de cinema (actividade extenuante em que alguém é pago para ver filmes)? É ser produtor dos programas do canal do momento, destinado ao público da faixa etária 0-3 anos, senhores e senhores, o babytv da foxlive. Para quem nunca viu, aquilo é só iiiiiihhh’s, uuuaaahhhh’s e tudo muito colorido e lento. Dois minutos e doze segundos de visionamento e tem-se a sensação de que se está a aspirar o subproduto da combustão de uma lareira a queimar ganza.
Mas aquilo que me dá a volta à cabeça são as razões para haver um canal deste tipo. A matemática é simples: a publicidade constitui o grosso da receita na perspectiva de quantos mais virem o canal, mais se ganha. Se assim é, que tipo de publicidade pode aliciar miúdos dos 0 aos 3 anos? Que é que eles poderão querer comprar? Ainda por cima com a agravante de eles ainda não dominarem a arte da chantagem emocional com adultos em tão provetas idades para poderem exigir através de fezes/ gritos/ choradeiras/ vomitado (riscar o que não interessa) a roca/ leite/ fralda/ monica belluci para ama (não é preciso riscar, já se sabe o que interessava).
Aqui entra a teoriazita. Um programa que lá bate certinho é o dos teletubies. É educativo, com enredo e polémico. Porque, aparentemente, o tal teletubie de cor violácea parece ser lóló. Igualzinho aos filmes porno. Eu não quero parecer homofóbico, mas eu tenho a certeza que se colocar um dvd dos teletubies de trás para a frente num gira-discos a setenta e oito rotações, ouve-se distintamente as letras g-a-y-p-o-w-e-r. Um programa para esse canal poderia ser, obedecendo à prerrogativa dos guiões com cor, lentidão, barulhinhos e alguma polémica, aquele da vida selvagem com as joaninhas a foder. Porque de pequenino ...

No outro dia tive um sonho estranho. Estava não sei onde, talvez numa festa de despedida de empresa; saí mais cedo da festa e, no caminho para a rua, dei de caras com um tipo que parecia o Drogba do Chelsea, todo vestido às cores e cabelos rastafari meios tapados pela tradicional touca tricolor. Veio em direcção a mim e abraçou-me com aquela naturalidade dos jamaicanos que são amigos de toda a gente (apesar de ele ser côteivoirense - os meus sonhos são transfronteiriços). Disse-me qualquer coisa como tudo-em-cima-má-méne. Quando voltei as costas distingui entre as sebes da propriedade dois pequenos vultos, dois gatos: um deles todo preto com a testa coberta com o mapa de África terçado a verde, amarelo e vermelho; o outro parecia que tinha vestido uma camisa havaiana. Lembro-me de ter sorrido para os gatos e eles sorrirem para mim.
Para provar que não sou homofóbico, eu não fiquei preocupado por ter sonhado com o Drogba, mas sim, por causa dos dois gatos coloridos e sorridentes. É que se juntarmos isto aos caldos de ganza e substituindo-se por cogumelos, a única história que tem gatos a rir é alice no país das maravilhas do lewis carrol e toda a gente sabe que esse livrinho tresanda a homossexualidade.

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

A Liberdade de Confusão

Problema velho de meses, a discordância por parte de alguns frisos da sociedade islâmica no concernente a um projecto de um jornal dinamarquês apostado em realizar uma jam session com cartoonistas de modo a perceber-se qual a verdadeira face de Maomé. Lembro o eventual leitor que a BBC já havia feito algo do género há dois ou três anos em relação ao verdadeiro viso de Cristo, com resultados surpreendentes. Por aquilo que os homens debuxaram, depreende-se que gostos não se discutem.
Uma das facções islamitas, mais existencialista, não gostou de ver uma representação mais pilosa de Maomé, com abundante barba e turbante em forma de bomba, alegando que o perfil baseado na extemporânea expressão pelas barbas do profeta “não representa uma interjeição conceptual transposta à realidade, será antes uma analogia à honradez própria do homem adulto, por imposição à irresponsabilidade do rapaz imberbe”; para mais que no tempo de Maomé não havia sido ainda descoberta a pólvora. Outra doutrina, a freudiana, discordou da coexistência entre o profeta com um cão, visto saber-se pelas passagens do Corão Apócrifo do Mar Morto que Maomé era alérgico a estes animais, rejeitando a tese de que o profeta tenha querido alguma vez entrar "em brincadeiras com o quadrúpede”.
Há aqui evidente confusão e estamos aqui para esclarecer a biografia deste importante personagem. Maomé era um homem magro, de compleição franzina mas de grande resistência, por ser corredor de grandes distâncias. De tez morena e barba fina, mas curta, tinha um metro e sessenta e oito e pesava cinquenta e nove quilos. Quem o quisesse encontrar, bastava procurá-lo entre Medina e Meca, localidades que balizavam o seu local de treino diário. Sujeito afável e simpático, era dado a crises de mau humor derivado da presença dos incómodos grãos de areia entre as sandálias e as solas dos pés. Perito em fugas para a frente, acabou a carreira como lebre em maratonas.
Existe, por isso, alguma confusão sempre que se quer perceber as grandes linhas dos países islâmicos. Outro exemplo capaz é aquele que envolve o Irão, que emprega moderna tecnologia na tentativa de exportar gasolina para a Dinamarca e a Noruega através de cocktails molotov lançados para dentro das suas embaixadas, já que ainda não existe um pipeline entre o Médio Oriente e a Jutlândia. E é com alguma preocupação que vejo alguns comentadores de política internacional (leia-se os costumeiros general Loureiro dos Santos e Nuno Rogeiro) a insistirem em ligar estes acontecimentos a um diferendo comercial que opõe o Irão à Noruega chamado “loiras por camelos”. A liberdade dá confusão.

C.

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Paladino Não-Sei-Do-Quê

Sendo a minha individualidade uma figura de proa de uma certa sociedade dedicada à perspectivação conceptual, tenho sido frequentemente acossado pela problemática em torno da figura Paladino não-sei-do-quê. Como o nome indica, o Paladino não-sei-do-quê dedica-se à defesa intransigente de causas. Quais causas? Todas as causas. O Paladino não-sei-do-quê difere dos outros paladinos por ser aquele indivíduo que toma como sua a bandeira das causas díspares.
A imagem primeira que temos do Paladino é a do cavaleiro andante, um justiceiro nómada, iconograficamente representado por indivíduo a cavalo, amiúdamente ladeado ou secundado pelo seu escudeiro, já que não consegue apertar as fivelas do bacinete sozinho (um bacinete é armadura, só que em francês). O mais conhecido será o trinómio Quixote&Rocinante&Sancho Pança, ainda que muitos não concordem com o mau exemplo de um paladino com alucinações (o vinho da Mancha tem muito grau e a continuidade monótona daquela paisagem aconselha o belo trago com frequência).
O Paladino não-sei-do-quê é, antes de mais, um indivíduo com tendência à solidão e desempregado, porque para se abraçar a carreira de paladino de todas as causas é preciso ter imenso tempo livre. O difícil é discernir se o ócio concorre para o desenvolvimento da patologia e não o amor solidário que move esta classe, à semelhança da gorda maioria do advogados portugueses que, despretensiosamente e repudiando possíveis compensações financeiras, aceitam representar qualquer litigância desde que o combate esteja assegurado. Em relação directa, o Paladino não-sei-do-quê recebe com frequência o epíteto de advogado do diabo, apesar de representar os interesses da religião. Por isso, este Paladino é controverso.
Exemplo do Paladino não-sei-do-quê é o hacker sagaz e sabe onde se escondem todas as mensagens subliminares: a palavra Echelom suscita-lhe o sorriso malicioso do tipo cúmplice. Faz downloads 24h/dia e vende dvd’s piratas só para o imperialismo não lucrar com a globalização, porque tem consciência antiglobal. É teórico acérrimo da conspiração e como todos os teóricos conspiradores, é ambientalista. Defende a pés juntos que “Cavaco Silva foi assassinado por um insecto intergalático que depois vestiu a sua pele, à semelhança do sucedido no MIB-I. Daí o candidato de direita ter aquele viso inexpressivo de olhos encovados que quando é confrontado com questões onde se mencionam fugazmente as palavras Lopes, fricção política e Santana, se limita a escancarar a boca, como quem tem filamentos de presunto entre os dentes do siso”. Ao mesmo tempo denuncia que “Mário Soares assassinou um verme intergalático e vestiu-lhe a pele, daí apresentar uma derme constituída por uma sequência de ondulados à la michelin e responder sempre bah! quando o questionam sobre o seu terceiro lugar nas sondagens”.
Ao abraçar o cursus honorum de campeão de todas as causas, o Paladino não-sei-do-quê não só levantou o cu do ócio, mas tornou-se na massa de que nascem os diplomatas e os políticos, i.é, é uma soma de negativo e positivo, mais e menos, ac/dc, equilíbrio de forças desiquilibradas, simultaneamente Paulo e Miguel Portas, é Francisco e é Louçã. È inimigo do leão e amigo da onça. É e não é.
O costume levar-me-ia ao encerramento desta crónica com uma tirada pseudo-inteligente em que a partir da reflexão inicial era produzida uma jocosa e laboriosa construção semântica onde a significância extrapolaria o significado; mas tal não farei, porque apesar de tudo, o Paladino não-sei-do-quê tem de ter alguém que o defenda.
El C.