Reparamos no outro dia que a Editorial Presença se atreveu a publicar aquilo que o Dr. Croivs percebeu ser a parte de uma triologia ou tetralogia chamada (salvo erro) O Segredo das Pedras Mágicas, escrito por uma Sandra Carvalho. Folheamos, com doseada aprrensão, um dos tomos da série, intitulado Guerreiro Lobo. É à Sandra Carvalho que o Dr. Croivs dirije a sua primeira carta aberta, em forma do ensaio Rudimentos para a Giza de uma Saga.
Minha querida,
Constatamos estarrecidos que o excelente selo editorial da Ed. Presença se associou a V. Ex.cia para cometer a loucura de lançar mais uma patranhada vaginal sobre florestas, brumas, heróis vagos e uns mistérios insossos com runas, a que se chama vulgarmente de aventura. O formato não é novo, mas tende-se a subverter, empobrecendo–se o género, exemplo do Eragorn, As Brumas de Avalon e outros folhetins que ficam a anos luz de um Lord O’ Rings ou A Távola Redonda.
Perante o teor superficial e tão distante dos cânones associados ao género em questão patentes na obra, o Dr. Croivs toma aqui a liberdade de lhe permitir o acesso às fórmulas para alcançar o sucesso que os editores de V. Ex.cia tão sabiamente lhe souberam omitir.
Quanto ao género em questão, é usual distinguir-se o estilo saga do estilo canção ou lôa. As mais conhecidos de entre este último elenco são a Chanson de Roland e El Cid (em americano The Sid); por seu turno, as sagas, que é o que V. Ex.cia parece querer apresentar, têm características próprias bem vincadas que deverão ser respeitadas.
Em primeiro lugar, a história. Uma saga terá forçosamente de contemplar uma viagem, a demanda. Depois ter-se-á de objectivar essa demanda, através da conquista, da exploração ou da apropriação de um bem mítico ou sagrado. Parece-me que estas partes estão evidentemente relatadas na sua obra que o Dr. Croivs apenas folheou, não leu. A estruturação dos ambientes e a descrição das paisagens deverá incluir doses generosas de cenários florestais, turfeiras, áreas lacustres, tundra e montanhas cobertas de neve.
Depois temos o problema das personagens. O primeiro é a sua nomeação. O nome de uma personagem de saga deverá ser obrigatoriamente composto pelas últimas sete letras do alfabeto, isto é, t, u, v, w, x, y, z, na proporção de 75%, incluindo eventualmente algum K. Toda a gente sabe que as sagas vêm do norte, e se estiverem escritas numa linguagem parecido com o basco, mais realismo expressarão. Depois é só desdobrar anagramas com aquela constituinte. Dou-lhe alguns exemplos para ilustrar esta técnica de nomear personagens: tuvyz, tyvwin, zywyn, zyl, wytux, etc. Uma inteligência iluminada como a de V. Ex.cia poderá facilmente agrupar os nomes, de modo a constituir os rudimentos de um esquema clânico, que é a base da sociedade nórdica antiga. O seu herói principal poderia ser Zyl, filho de Zyl, o Bravo, neto de Zylwin, o Antigo. E por aí fora.
A composição do perfil das personagens também deve ser cuidado. Assim, ter-se-á em conta que o herói é sempre um indivíduo filho ou neto de rei, com uma tatuagem ou alguma marca de nascença (fala e lê uma dúzia de idiomas, maneja com destreza várias armas e é bem parecido, veste peles e é loiro), que foi raptado, ou abandonado, ou apenas perdido quando recém nado, cuja missão consiste na recuperação do trono de seu pai agora usurpado por algum tirano e devolver a justiça ao lugar. Para tal associar-se-á a um mago ou uma feiticeira que o educou, bem como a alguns mercenários de várias proveniências. Peça importante é a inclusão de algum desajeitado trapalhão que tem um papel importantíssimo no desfecho da saga, por transportar consigo uma chave especial, ou ser parente de algum dos verdugos da última cena.
Muito importante é a apresentação do tomo. Convenhamos que o nome Sandra Carvalho não é sonante. Qualquer escritor de sagas nunca poderá ter um nome português, ainda que em mirandês já seja aceitável. Cole a si própria um rótulo inteligente: transforme o seu nome, latinize-o. Carvalho tem o nome científico de quercus robur, ou mesmo niger. Aplicando-lhe a regra do anagrama das 7 últimas letras do alfabeto, poder-se-á obter um provisório Sandra Kwercus Rowur, com supressão do desdobramento do nome central para a inicial K; Sandra K. Rowur é de longe bem mais sofisticado, artístico e propenso a fazer um figuraço nos escaparates (até parece o nome daquelas matronas inglesas com óculos de armação de asa de morcego, azedas como limões e com ar de mal montadas, estilo Ágatha Christie).
A ilustração da capa é fundamental, por isso é necessário abandonar a mariquice pegada que tem na capa de sua obra. Aquilo é algum guerreiro? Parece o gajo do anúncio do William Lawson’s mas mais apaneleirado. Deverá primeiro, contactar o ilustrador das discos dos Manowar. Esses sim, é que são guerreiros viris e consentâneo com a cultura androcêntrica patente nas sagas.
Por último, o título. O que é que lhe passou pela cabeça para escrever uma coisa tão pirosa como Guerreiro Lobo? Porque não Águia ou até Leão? Era mais futebolístico e certamente vendia mais uns exemplares. Percebo que nas sagas a fórmula dragão estará algo esgotada e até perseguida, mas lobo? Sinceramente, isto é canzanas a mais. Se quer associar animais ao título, atire a ave mítica mais procurada, logo a seguir à fénix, o corvo, aliás de onde tomamos o nosso nome. Percebe-se que estará presa a essa fórmula típica dos gineceus, as pedras mágicas. Mas quer dar-lhe um nome de saga? Chame-lhe as runas, as Runas de Avalon (AH AH AH AH AH, perdão LOL). Mas vamos fazer isto de forma científica: escolha um número de um a nove. O seis? OK, pode ser. Agora diga-me, tem uma enciclopédia em casa,? Sim? Então abra o volume 6 da enciclopédia ao calhas e escolha alguns termos. O Dr. Croivs escolheu glicosúria (significa a presença de glicose na urina. Característica dos diabéticos ou dos indivíduos com perturbações renais) e, sorte das sortes, um sinónimo de pedra, gneisse (rocha sedimentar cuja composição é em geral granítica. A sua estrutura é laminar ou estratificada, nela participando ainda o felsdpato, o quartzo e a mica em palhetas). Como ninguém sabe os significados poderá ter assim alinhado o seguinte genérico para a sua futura obra: As Runas de Glicosury – A Gneisse do Corvo.
E pronto, o Dr. Croivs oferece-lhe os ingredientes para uma saga bem gizada, qualitativamente bem distante do tratado para adolescentes impúberes que tem andado a poluir as estantes das livrarias.
Croivs
P.S. I: Não esquecer que para escrever uma saga não basta imaginar um reino distante e ter lido as técnicas de guerra do Sun Tzu adaptadas à gestão de empresas.
Minha querida,
Constatamos estarrecidos que o excelente selo editorial da Ed. Presença se associou a V. Ex.cia para cometer a loucura de lançar mais uma patranhada vaginal sobre florestas, brumas, heróis vagos e uns mistérios insossos com runas, a que se chama vulgarmente de aventura. O formato não é novo, mas tende-se a subverter, empobrecendo–se o género, exemplo do Eragorn, As Brumas de Avalon e outros folhetins que ficam a anos luz de um Lord O’ Rings ou A Távola Redonda.
Perante o teor superficial e tão distante dos cânones associados ao género em questão patentes na obra, o Dr. Croivs toma aqui a liberdade de lhe permitir o acesso às fórmulas para alcançar o sucesso que os editores de V. Ex.cia tão sabiamente lhe souberam omitir.
Quanto ao género em questão, é usual distinguir-se o estilo saga do estilo canção ou lôa. As mais conhecidos de entre este último elenco são a Chanson de Roland e El Cid (em americano The Sid); por seu turno, as sagas, que é o que V. Ex.cia parece querer apresentar, têm características próprias bem vincadas que deverão ser respeitadas.
Em primeiro lugar, a história. Uma saga terá forçosamente de contemplar uma viagem, a demanda. Depois ter-se-á de objectivar essa demanda, através da conquista, da exploração ou da apropriação de um bem mítico ou sagrado. Parece-me que estas partes estão evidentemente relatadas na sua obra que o Dr. Croivs apenas folheou, não leu. A estruturação dos ambientes e a descrição das paisagens deverá incluir doses generosas de cenários florestais, turfeiras, áreas lacustres, tundra e montanhas cobertas de neve.
Depois temos o problema das personagens. O primeiro é a sua nomeação. O nome de uma personagem de saga deverá ser obrigatoriamente composto pelas últimas sete letras do alfabeto, isto é, t, u, v, w, x, y, z, na proporção de 75%, incluindo eventualmente algum K. Toda a gente sabe que as sagas vêm do norte, e se estiverem escritas numa linguagem parecido com o basco, mais realismo expressarão. Depois é só desdobrar anagramas com aquela constituinte. Dou-lhe alguns exemplos para ilustrar esta técnica de nomear personagens: tuvyz, tyvwin, zywyn, zyl, wytux, etc. Uma inteligência iluminada como a de V. Ex.cia poderá facilmente agrupar os nomes, de modo a constituir os rudimentos de um esquema clânico, que é a base da sociedade nórdica antiga. O seu herói principal poderia ser Zyl, filho de Zyl, o Bravo, neto de Zylwin, o Antigo. E por aí fora.
A composição do perfil das personagens também deve ser cuidado. Assim, ter-se-á em conta que o herói é sempre um indivíduo filho ou neto de rei, com uma tatuagem ou alguma marca de nascença (fala e lê uma dúzia de idiomas, maneja com destreza várias armas e é bem parecido, veste peles e é loiro), que foi raptado, ou abandonado, ou apenas perdido quando recém nado, cuja missão consiste na recuperação do trono de seu pai agora usurpado por algum tirano e devolver a justiça ao lugar. Para tal associar-se-á a um mago ou uma feiticeira que o educou, bem como a alguns mercenários de várias proveniências. Peça importante é a inclusão de algum desajeitado trapalhão que tem um papel importantíssimo no desfecho da saga, por transportar consigo uma chave especial, ou ser parente de algum dos verdugos da última cena.
Muito importante é a apresentação do tomo. Convenhamos que o nome Sandra Carvalho não é sonante. Qualquer escritor de sagas nunca poderá ter um nome português, ainda que em mirandês já seja aceitável. Cole a si própria um rótulo inteligente: transforme o seu nome, latinize-o. Carvalho tem o nome científico de quercus robur, ou mesmo niger. Aplicando-lhe a regra do anagrama das 7 últimas letras do alfabeto, poder-se-á obter um provisório Sandra Kwercus Rowur, com supressão do desdobramento do nome central para a inicial K; Sandra K. Rowur é de longe bem mais sofisticado, artístico e propenso a fazer um figuraço nos escaparates (até parece o nome daquelas matronas inglesas com óculos de armação de asa de morcego, azedas como limões e com ar de mal montadas, estilo Ágatha Christie).
A ilustração da capa é fundamental, por isso é necessário abandonar a mariquice pegada que tem na capa de sua obra. Aquilo é algum guerreiro? Parece o gajo do anúncio do William Lawson’s mas mais apaneleirado. Deverá primeiro, contactar o ilustrador das discos dos Manowar. Esses sim, é que são guerreiros viris e consentâneo com a cultura androcêntrica patente nas sagas.
Por último, o título. O que é que lhe passou pela cabeça para escrever uma coisa tão pirosa como Guerreiro Lobo? Porque não Águia ou até Leão? Era mais futebolístico e certamente vendia mais uns exemplares. Percebo que nas sagas a fórmula dragão estará algo esgotada e até perseguida, mas lobo? Sinceramente, isto é canzanas a mais. Se quer associar animais ao título, atire a ave mítica mais procurada, logo a seguir à fénix, o corvo, aliás de onde tomamos o nosso nome. Percebe-se que estará presa a essa fórmula típica dos gineceus, as pedras mágicas. Mas quer dar-lhe um nome de saga? Chame-lhe as runas, as Runas de Avalon (AH AH AH AH AH, perdão LOL). Mas vamos fazer isto de forma científica: escolha um número de um a nove. O seis? OK, pode ser. Agora diga-me, tem uma enciclopédia em casa,? Sim? Então abra o volume 6 da enciclopédia ao calhas e escolha alguns termos. O Dr. Croivs escolheu glicosúria (significa a presença de glicose na urina. Característica dos diabéticos ou dos indivíduos com perturbações renais) e, sorte das sortes, um sinónimo de pedra, gneisse (rocha sedimentar cuja composição é em geral granítica. A sua estrutura é laminar ou estratificada, nela participando ainda o felsdpato, o quartzo e a mica em palhetas). Como ninguém sabe os significados poderá ter assim alinhado o seguinte genérico para a sua futura obra: As Runas de Glicosury – A Gneisse do Corvo.
E pronto, o Dr. Croivs oferece-lhe os ingredientes para uma saga bem gizada, qualitativamente bem distante do tratado para adolescentes impúberes que tem andado a poluir as estantes das livrarias.
Croivs
P.S. I: Não esquecer que para escrever uma saga não basta imaginar um reino distante e ter lido as técnicas de guerra do Sun Tzu adaptadas à gestão de empresas.
P.S. II: O Dr. Croivs qualquer dia apresentará um esboço sinóptico de uma saga para lhe servir de referência.
5 comentários:
Esplêndido foi a única palavra que encontrei para descrever o teu post...
Cumprimentos
AH AH AH AH AH, perdão LOL! De uma fluência comparável a muitos outros, mas ímpar pela articulada teia de símbolos e significados que indica. V. Exa. deveria escrever, por vós, a referida Saga... Já agora, aproveite a designação escolhida para começar a criar!!!!! Mais uma vez, desconfio que seja careca... Abraço (mas nada desses fortes e amaricados!)
Fantástico Dr. Croius. Peço desculpa pelo comportamento do meu colega Quiosk. Ele julga que eu e o Dr. so os a mesma pessoa, o que a meu ver é uma tremenda injustiça.
O Dr. tem uma escrita, segundo ele, na mesma linha que a minha, por isso não leve a mal os epítetos de careca nos posts do já referido Quiosk.
Deixemnos o sr. e o dr. para trás.
Que maravilha de carta aberta!!! Tenho que dar uma vista de olhos a essa saga!!!
Já agora, não queres partcicipar na manta de retalhos?
abraço
Comment aberto, a quem o quiser apanhar: Caro Dr. Croius, peço desculpa pela manifestação extemporânea de Terceleiros, relamente não chamava careca a Miguel mas sim a v. exa, como poderá constatar pelos comentários a este post e ao meu próprio! Quanto ao tratamento formal, concerteza que o continuarei a tratar como se deve, por senhor doutor! Já agora, agradeço, antecipadamente, a atenção de vossa senhoria a tão incipiente comentário.
Com os meus melhores cumprimentos, despeço-me com amizade do senhor doutor!
Manannan Terceleiros Quioske:Tanta simpatia assim lisonjeia-me. Não me creio credor de tanto. A saga sairá amanhã,juntamente com outras reflexões, pois movimento-me em sítios onde não posso adir posts. E sim, faço parte da tribo dos sem algum cabelo.
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